terça-feira, 6 de agosto de 2019

SER FELIZ



 
O sentido de nossa vida é ser feliz. Desde o instante em que nasce, todo ser humano quer a felicidade e não o sofrimento. Nem o condicionamento social, nem a educação, nem a ideologia afetam isso. No âmago de nosso ser, simplesmente desejamos o contentamento.

POTENCIAL PARA O BEM

Como seres humanos, temos o potencial para sermos pessoas felizes e compassivas e também para sermos infelizes e prejudiciais para os outros. O potencial para essas coisas está sempre presente em cada um de nós. Se quisermos ser felizes, então o importante é tentar estimular os aspectos positivos e úteis, na mesma medida, tentar reduzir os aspectos negativos.

Fazer coisas negativas, como roubar e mentir, pode às vezes parecer proporcionar um tipo de satisfação a curto prazo, mas a longo prazo elas sempre nos trarão tristezas. Já as ações positivas sempre nos trazem força interior. Com força interior, temos menos medo e mais autoestima, e torna-se muito mais fácil estender nossos sentimentos de afeição aos outros sem barreiras, sejam elas religiosas, culturais ou de qualquer tipo. Assim, é muito importante reconhecer nosso potencial tanto para o bem quanto para o mal e em seguida observá-lo e analisá-lo cuidadosamente.

A MENTE COMPASSIVA

Em termos simples, compaixão e amor podem ser definidos como pensamentos e sentimentos positivos que dão origem a coisas tão essenciais na vida quanto a esperança, a coragem, a determinação e a força interior. Na tradição budista, a compaixão e o amor são vistos como dois aspectos da mesma coisa: compaixão é o desejo de que outro ser se liberte do sofrimento; amor é querer que sejam felizes.

Pra começar, é possível dividir qualquer tipo de felicidade e sofrimento em duas grandes categorias principais: mental e física. Das duas, é a categoria mental que exerce maior influência sobre a maioria de nós, pois constantemente está registrando cada acontecimento, por menor que seja, e por isso é a que merece mais esforço para se obter a paz.


As nossas mentes podem ser desenvolvidas por treinamento constante. Para que a verdadeira felicidade possa acontecer, precisamos desenvolver uma mente calma, e essa paz de espírito só é proporcionada por uma atitude compassiva constante. No dia a dia, com cada experiência nova, podemos gradualmente nos esforçar para nos desenvolver tanto uma empatia genuína pelo sofrimento dos outros quanto uma vontade de ajudar a eliminar sua dor.

RECONHECENDO A COMPAIXÃO

Muitas formas de sentimento compassivo estão misturadas com o desejo e com o apego. É necessário reconhecer se nosso amor é motivado por mais necessidade pessoal do que por uma afeição genuína por outra pessoa. A verdadeira compaixão não é apenas uma resposta emocional, mas um comprometimento sério baseado na razão. Por causa dessa base firme, uma atitude verdadeiramente compassiva em relação aos outros não muda, mesmo que os que estão à volta se comportem de forma negativa.
A compaixão genuína não está baseada em nossas próprias projeções e expectativas, mas sim nas necessidades do outro: independente de a outra pessoa ser um amigo querido ou um inimigo, contanto que essa pessoa deseje paz e felicidade e deseje superar o sofrimento. Para o propósito budista, o objetivo é desenvolver a compaixão genuína pelo bem-estar de todo ser vivo no universo, reconhecendo os organismos vivos como sencientes e, portanto, sujeitos à dor e capazes de felicidade.

OBSTÁCULOS À COMPAIXÃO

Para desenvolvermos uma atitude amorosa devemos começar removendo os maiores obstáculos à compaixão: a raiva e o ódio. Essas emoções extremamente poderosas podem sufocar nossas mentes, mas, mesmo assim ainda podem ser controladas. Caso contrário, os impulsos dominarão e impedirão nossa busca pela felicidade de uma mente cheia de amor.
Embora a raiva por vezes possa parecer útil por gerar mais energia, confiança e determinação, ela é cega e não nos permite avaliar se os resultados serão positivos e negativos, pois oculta uma parte de nosso cérebro: a racionalidade. Um antídoto gerado pela compaixão igualmente poderoso à raiva, mas muito mais passíveis de controle, são a razão e a paciência, que, infelizmente, muitos veem como sinais de fraqueza, quando, na verdade, seriam os verdadeiros sinais de força interior. A compaixão é, por natureza, gentil, pacífica e suave, mas também muito poderosa. Ela nos dá força interior e nos permite sermos pacientes. Aqueles que perdem a paciência com facilidade são inseguros e instáveis e, neste caso, a raiva pode ser uma demonstração direta de fraqueza.
Portanto, quando um problema surgir, tente permanecer humilde e manter uma atitude sincera, preocupando-se com a justiça do desfecho. É claro que outras pessoas poderão tirar vantagem de sua preocupação com a justiça. Se a sua atitude imparcial só encorajar agressões injustas, adote uma posição firme. No entanto, isso deverá ser feito com compaixão e, se tiver que expressar seus pontos de vista e tomar medidas fortes, faça-o sem raiva nem más intenções. Para reprimir seu próprio impulso egoísta de retaliar, lembre-se de seu desejo de praticar a compaixão e assumir a responsabilidade de ajudar a evitar que a outra pessoa sofra as consequências de seus atos.


AMIGOS E INIMIGOS

É importante ressaltar que simplesmente pensar que a compaixão, a razão e a paciência são boas não é suficiente para desenvolvê-las. E para praticá-las é necessário que surjam dificuldades e, neste caso, justamente nossos inimigos são os que nos fornecem essa oportunidade. Se quisermos aprender devemos considerar nossos inimigos os nossos maiores professores! Afinal são eles quem mais pode nos ajudar a desenvolver uma mente tranquila. Por outro lado, a melhor maneira de fazer amigos é ser muito compassivo! Sá a afeição nos traz verdadeiros amigos. Uma amizade genuína só pode surgir por meio de uma cooperação baseada na honestidade de na sinceridade, e isso significa ter uma mente aberta e um coração generoso.
Mas o maior inimigo de todos é o inimigo interior representado pela raiva ou ódio. Estas são as forças que mais precisamos confrontar e derrotar, não “inimigos” temporários que aparecem de forma intermitente em nossa vida. E para eliminar completamente o potencial destrutivo da raiva e do ódio, precisamos reconhecer que suas raízes estão na atitude que valoriza nosso próprio bem-estar e benefício ao mesmo tempo em que ignora o bem-estar dos outros. Esta atitude egoísta está na origem não apenas da raiva, mas de praticamente todos os nossos estados de espírito. É uma atitude iludida, que tem uma percepção equivocada da maneira como as coisas realmente são, e esse equívoco é responsável por todo o sofrimento e a insatisfação que sentimos. Para ver claramente esse processo destrutivo, precisamos nos conscientizar da natureza da mente...

CONSCIÊNCIA E ATENÇÃO

Segundo a filosofia budista, existem muitos tipos de mente, ou consciência, e na meditação budista desenvolvemos uma profunda familiaridade como nossos estados mentais em constante mudança. As escrituras budistas mencionam oitenta e quatro mil tipos de pensamentos negativos e destrutivos, que têm oitenta e quatro mil abordagens ou antídotos correspondentes. Isso só nos mostra na verdade que é preciso aplicar muitos métodos diferentes durante um longo período para obter resultados duradouros. Assim, precisamos de grande determinação e paciência.
Já que a compaixão e um bom coração se desenvolvem graças a um esforço constante e consciente, é importante primeiro identificar as condições favoráveis que dão origem a nossas próprias qualidades de gentileza e depois identificar as circunstâncias adversas que nos impedem de cultivar esses estados de espírito positivos. Assim, é importante que levemos uma vida de consciência e alerta mental constantes para alcançar a paz interior e promover um ambiente de paz externamente.

Fonte: Uma Vida de Compaixão, Sua Santidade, o Dalai Lama, Editora Bertrand Brasil



 

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